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A crise climática é racista

Imagem: iStock

Falta um mês para o encontro climático mais esperado do mundo, a COP. Esta é a 26ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que tem como debate principal a descarbonização do planeta por meio da redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE). Este ano, a COP acontece em Glasgow, no Reino Unido, depois de ter sido adiada em 2020 por conta da pandemia.

Será um grande momento com governos do mundo inteiro se reunindo para colocar na mesa suas ambições para esta agenda, até mesmo o Brasil, mesmo que seja só um teatro sobre a preocupação climática do país. E há também os empresários milionários organizados para ocupar espaços no encontro, enquanto a maior parte da sociedade civil segue sem recursos e sem condições para estar em Glasgow.

Desde que ouvi falar da COP, soube da sua existência, achei que não era um evento para todos, para as pessoas que fazem luta no território contra a desigualdade social, uma luta pela existência de povos inteiros vivendo à margem da sociedade, com pobreza, fome, desemprego, desastres climáticos constantes e uma vida inteira pisando no esgoto a céu aberto em algum lugar esquecido pelo poder público.

Esses exemplos combinam muito com o Brasil, né? São situações comuns nas mais diversas periferias desse país. Abrimos o jornal ontem, hoje e talvez amanhã e as capas não nos falam da fome de forma alarmante, não importa muito. Entre poucas reportagens sobre a situação, se destaca uma capa do jornal Extra de ontem (29), que mostra pessoas pegando restos de ossos e carnes rejeitados por supermercados para comer.

O gás de cozinha aumentou o preço. Então, mesmo se você tiver comida, cozinha como?

Pense na fome, na enchente, no deslizamento de terra, na falta de peixe na pesca, na pouca ou nenhuma água, na escassez da agricultura e adivinhe a cor e o gênero das pessoas que sofrem diariamente com o que acontece no planeta, sem nenhum subsídio ou política pública do governo?

A crise climática é racista! E a maior parte das soluções até aqui apresentadas para ela, também!

Por isso, a participação expressiva da sociedade civil na COP26 deveria ser facilitada e esperada, mas não é. Para além de organizações ambientalistas, é necessário que o debate sobre direitos humanos nas questões climáticas esteja na centralidade da agenda.

Já paramos para pensar que esse abismo da crise climática é resultado da colonização? Longe né? Uma visão de mundo antigo e imperialista que enxerga a população negra e indígena da América Latina, África e Ásia como habitantes de lugares abertos para exploração e abertos para serem roubados — toda a suas riquezas não merecem estar ali para a sua população. Ignorando esses lugares como território com histórias, tradições, conhecimento e famílias, sendo essas últimas as que historicamente protegem a natureza para sobreviver nos seus lugares de nascimento.

São as populações, nos territórios marginalizados, que menos contribuem para a crise climática. Mas são as mais atingidas diariamente, pois foram transformadas em vulneráveis pela colonização que chegou atravessando tudo com o racismo.
Talvez esse debate deveria ser a principal pauta de um encontro internacional sobre a crise climática, mas não só. Deveria ser pauta central em qualquer projeto político. Tanto o debate climático, quanto o movimento por justiça racial precisam ser centrais nas discussões. Essas questões são indissociáveis.

racismo ambiental não pode passar despercebido, não pode ser um tema esquecido no canto e que se desloque das discussões e tomadas de decisão, tanto dos governos quanto das organizações ambientalistas brancas.

Quando vamos descolonizar esses espaços?

A COP26 será uma oportunidade de exigir soluções para a emergência climática que priorizem a injustiça social e racial, com urgência. Mais do que nunca é necessário ações climáticas internacionais, que apontem e reconheçam que justiça climática é justiça racial.

Os movimentos ambientalistas precisam estar atentos as demandas e ao que os movimentos negros, indígenas e periféricos de todo o mundo apresentam. Por tempo demais, líderes do movimento ambientalista do Brasil e do mundo, em sua maioria pessoas brancas, não prestaram atenção suficiente aos impactos climáticos sentidos pelas pessoas negras e pardas. E esse ponto não é falta de tempo ou teimosia, mas racismo institucionalizado.

Estamos no ano de 2021, não podemos fechar os olhos para o racismo ambiental na resposta à crise climática. Ao fazer isso legitimamos o mesmo sistema que nos colocou nessa confusão descontrolada.

As mudanças climáticas caminham para ser a conclusão do colonialismo, mas reconhecer e priorizar essa realidade é urgente para aplicarmos ações significativas para equidade racial e climática no mundo.


Fonte: [Ecoal UOL – Mariana Belmont]